sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Reportagem: Jornal Opinião - 25 anos Depois

JORNAL OPINIAO
MARÇO DE 64, 25 ANOS DEPOIS
Belo Horizonte, de 26/3 a 1/4/89.

Esquerda e Direita confessam: a revolução de 64 foi um equivoco
Francisco de Assis Pinheiro;

Antes de assumir, Castello Branco garantiu que somente ficaria na Presidência até as eleições marcadas para 65.
Dois caminhos de mesma viagem. A viagem que começou a 25 anos, no dia 31 de março de 1964, num trem que os maquinistas tentaram descarrilar e que hoje, a poucos meses das eleições diretas para Presidente, o povo faz voltar aos trilhos. A história e assim: um trem que segue um caminho tortuoso, com longos túneis escuros e passagens turbulentas e perigosas. Mas o trem de ferro, imagem forte da paisagem mineira, segue o rumo da esperança. O Coronel Jose Geraldo de Oliveira, ex-comandante da PM, conta o seu lado, reconhecendo descaminhos com rara honestidade. No vagão popular, o ex-líder dos bancários de Belo Horizonte, Antonio Faria, cultiva paciência e renova a sua fé. Valeu a pena?
 


Coronel Jose Geraldo: o erro
“Foi um engano. Foi um lamentável equivoco. Se eu soubesse que o movimento de 64 iria dar no que deu, no que vejo hoje, não teria tomado parte dele. Jamais faria o que fiz outra vez. Durante dois anos preparei a Policia Militar de Minas Gerias para uma Revolução que vencesse a corrupção e a subversão.
Hoje, 25 anos depois, sei que o que aconteceu foi um golpe. O movimento nos conduziu a aquilo que temíamos. A Corrupção tomou conta de Minas e do Brasil. Fomos meros serviçais dos magnatas. A cada dia eles se tornaram mais ricos e o povo ficou cada vez mais pobre”.
 A importância deste depoimento deve-se ao fato de ser do Coronel Jose Geraldo de Oliveira, Comandante da Policia Militar de Minas Gerais de 1962 a 1966, um dos mais importantes lideres militares do movimento de 1964. Para que se tenha uma idéia da importância da PM de Minas naquela época, basta lembrar que a corporação contava com um efetivo de 20 mil homens bem treinados, enquanto que o Exercito não dispunha de mais do que 4 mil soldados em todo o Estado, a maioria rapazes que protestavam o serviço Militar Obrigatório.
 
Magalhães Pinto conspira
 
Foi em março de 1962 que o Coronel Jose Geraldo de Oliveira assumiu o Comando Geral da PM mineira. Em sua primeira conversa com o governador Magalhães Pinto, sua missão ficou bem clara: “estou convencido de que o Brasil não sairá da situação em que se encontra a não se pela força das armas, portanto prepare a PM para isto”, avisou o governador, segundo relata o Coronel. “Fiquei orgulho por que sentia que, mais do que um comandante da PM, surgiria diante de mim uma missão da maior importância”, recorda-se o Coronel, revelando que, a partir daquele momento iniciou um longo trabalho de preparação do golpe.
O Coronel Jose Geraldo de Oliveira, hoje um pacato chefe de família, com 75 anos, pai de 11 filhos e com 30 netos, morador em uma casa modesta no bairro Santa Efigênia, Belo Horizonte, não pensava em golpe militar. “estávamos convencidos de que tratava-se de uma Revolução – garante ele – única forma de tirar o pais da situação em que estava. Aceitei minha missão com a consciência voltada para o velho ditado romano – “salus populi, suprema lex est”: a salvação do povo e a lei suprema”.
Para ele o descaminho começou com a renuncia do Presidente Jânio Quadros: “Foi o maior desserviço que um cidadão já pode prestar a Pátria; traição mesmo”. Com a ascensão de João Goulart ao poder e o crescimento das forças populares, de esquerda, o clima esquentou. As denuncias acumuladas de corrupção, desde governos passados, forjaram o comportamento de muitos militares, segundo o Coronel.
 
Providencial Missão
 
Desde o aviso do governador Magalhães Pinto, o Coronel Jose Geraldo de Oliveira não teve mais descanso. Percorria centenas de municípios mineiros, visitava batalhões, fazia preleções, enfim “preparava os espíritos de oficiais e soldados para a providencial missão da PM, o destino glorioso de um dia podermos oferecer a nossa vida pela pátria”, como ele próprio relata.
Ao assumir a PM, o Coronel controlava um contingente de 10 mil soldados. Dois anos mais tarde, em abril de 64, a tropa havia duplicado. Além do aumento em seus quadros, a PM mineira crescia em unidade de pensamento revolucionário e em sua forte disciplina hierárquica. O próprio general Carlos Luis Guedes, Comandante das Tropas Infantaria Divisionária 4, a ID-4 de Belo Horizonte, dizia ao Coronel Jose Geraldo que a tropa de combate seria a tropa da PM. “Nas tropas armadas – lembra o Coronel – havia muitos problemas. Havia comandos revolucionários e comandos leais ao presidente João Goulart. Em 63 já era visível a inversão da hierarquia nas Forças Armadas em vários pontos do Pais. Sargentos e cabos desrespeitavam ordens de oficiais. Pelo contingente e pela disciplina, eu sabia que cabia a PM um importante papel na Revolução. No dia marcado, por exemplo, o 11º. Regimento do Exercito, de São João Del-Rey, marchou sem 60 sargentos, cabos e soldados. A unidade militar de Três corações, inteira, não aderiu”.
 
Tiradentes – a senha
 
“Falar sobre revolução e fácil, fazê-la e que é difícil”, lembra o Coronel Jose Geraldo, ao descrever a marcha que detonou o movimento de 64: “No dia 28 de março de 64 participei de uma reunião em Juiz de Fora, onde o general Olimpio Mourão Filho, Comandante da 4ª região Militar, o general Guedes e outras autoridades discutiam a gravidade da situação. Naquela noite eu falei: Se vocês querem fazer a revolução, tem que ser já. Eu, que preparava a PM há dois anos, imaginava que os planos do Exercito estivessem claros e definidos. Eu queria ouvir do general Mourão Filho a definição de quando seria detonado o movimento, qual era a missão da PM, coisas assim. Pedia-lhe um prazo de 24 horas para recolher os soldados de todo o Estado aos quartéis. O general manifestou hesitação e me respondeu: O Senhor faça como achar melhor”.

No dia 29, o coronel Jose Geraldo chamou a sala do Comando o chefe de seu Estado Maior. Coronel Afonso Barsante. Eram 6 horas da tarde e a ordem era distribuir a todos os comandos um envelope lacrado, contendo os planos e missões de cada unidade. Os envelopes só poderiam ser abertos quando viesse a senha do Comandante: “Tiradentes e nosso patrono”. O dia 30 amanheceu com a PM ocupando todos os depósitos de combustível de Estado e requisitando todos os meios de transporte em circulação, caminhões e ônibus.

‘Quando reuni o Alto Comando e anunciei nossa missão, muitos se surpreenderam. Eu guardava forte segredo do assunto. Mas um oficial começou a rir. Dei um soco na mesa e adverti que não estava brincando: ou assumia ele a missão, ou seria até fuzilado”, lembra o Coronel.
 
Magalhães não assumiu
 
Para o Coronel José Geraldo de Oliveira, tudo começou a falhar no próprio dia 31. “Foi uma surpresa o sucesso da operação. Estávamos preparados mesmo para uma guerra e isto não aconteceu. A noite, muitos populares já comemoravam a vitória em frente ao Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte. Eu conversava com o governador Magalhães Pinto, no jardim do Palácio e lhe dizia: assuma a presidência, Magalhães. Mas ele disse que só o faria com o apoio total das Forças Armadas. E não quis ir buscar este apoio em Brasília. Ai as coisas começaram a seguir outros rumos afirma.
 
O Marechal Castello Branco, antes de assumir, reuniu-se com lideranças políticas e garantiu que somente ficaria na Presidência até o dia das eleições marcada para 65. A Juscelino Kubitschek, ele garantiu: “estas mãos não assinarão a sua cassação”, relata o coronel. O regime militar durou 25 anos e JK foi um dos primeiros políticos a ver casados dos seus direitos políticos.

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário